terça-feira, novembro 08, 2005

Espacial Urgente!

Nosso enviado especial, João Paulo Arruda, divulga em primeira mão para os leitores do Urgente! o release do novo livro sobre Raul Seixas, "O baú de Raul revirado".

Logo no início do livro "O baú do Raul revirado" (Ediouro, R$ 45), um texto manuscrito pelo próprio Raul Seixas dá a medida exata da obsessão do roqueiro pela perpetuação de seus pensamentos: "Nada poderia ser esquecido", escreveu ele, justificando a existência do baú.

De fato, nada foi. Organizado pelo jornalista Silvio Essinger a partir dos arquivos da ex-mulher de Raul, Kika Seixas, e do presidente do fã-clube Raul Rock Club, Sylvio Passos, o livro reúne mais de mil imagens, entre fotos das várias fases da vida de Raul, bilhetes, cartas e letras rabiscadas. De quebra, com o livro ainda há um CD que traz seis faixas inéditas, a maior parte gravações caseiras. Entre elas, "Lena", uma bela e ingênua canção de amor, que traz um Raul Seixas doce, desarmado, como poucas vezes visto em sua carreira.

Essinger conta que o trabalho de pesquisa foi, por várias vezes, emocionante:
- Esbarrar com o manuscrito original de músicas como "Gita" é realmente especial.

O livro, que será lançado hoje numa festa no Teatro Odisséia, na Lapa, revira a fundo o mito. Estão lá a genialidade de quem escreveu versos de "Metaformose ambulante" aos 13 anos, a irresponsabilidade com o trabalho e com o próprio corpo ("Dia de pôr voz em ‘Há 10 mil anos’. Eu sei que tenho um sucessão nas mãos e fui ao estúdio completamente bêbado"), a doçura de pai ("Não durmo fácil; passo a noite acordado quando Vivi, minha filha, está tossindo").

Ao aproximar fãs e o pensamento bruto, sem retoques ou marketing de gravadora, de Raul Seixas, "O baú do Raul revirado" desnuda o mito. E por vezes aprofunda. Afinal, no mesmo recheio de papel dividem espaço trechos como "eles não gostam por inveja porque não podem mais fazer o que os moços fazem (falando sobre os "velhos" e o rock)" e "O cerco dos incansáveis altruístas malucos; todo dia é dia de hospício aberto. A insanidade está solta. O preço está alto. Está difícil ser pessoa por aqui por entre as caras oleosas das quimeras de cera. À noite as máscaras são retiradas para o uso no dia seguinte."

Há curiosidades tocantes. Como os versos que Raul fez para Elis Regina, revelando ter composto "Areia da ampulheta" para a Pimentinha cantar. À medida em que o livro avança, é possível notar a decadência física do ídolo.

- A letra dele ia ficando garranchada. Dava uma melancolia - conta Essinger.

É realmente melancólico. O último texto de Raul, fritando peixe em casa, sozinho, esquecido, ouvindo "À beira do Pantanal" e dizendo que iria rir amanhã do que escrevera naquela noite. Para Raul Seixas, o amanhã não chegou. Está lá, nas últimas páginas, a réplica do atestado de óbito: Falecido: Raul Santos Seixas. Causa da Morte: pancreatite crônica hipoglicemia parada cardio resp.

No fim do livro, outra mostra do lado profético do roqueiro: "Agora é Raul Seixas quem Raul vai encarar", dizia o verso de "Banquete de lixo", canção de seu último disco. Raulzito encarou. E não sobreviveu a si mesmo.

João Paulo Arruda

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